Pesquisadores da UFVJM produzem dossiê sobre sistema agrícola tradicional dos apanhadores de sempre-vivas

Sistema Agrícola tradicional da região de Diamantina recebe reconhecimento da FAO

Em solenidade realizada ontem, dia 11 de março, em Brasília, no Ministério da Agricultura, o sistema agrícola tradicional dos apanhadores de sempre-vivas na Serra do Espinhaço foi reconhecido como Sistema de Patrimônio Agrícola de Importância Global (GIAHS), gerenciado pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). É a primeira vez que uma região do Brasil conquista o reconhecimento do GIAHS.

O selo de reconhecimento, concedido pela FAO, é destinado a sistemas no mundo que atravessaram adversidades ao longo da história e, mesmo assim, foram capazes de manter suas tradições culturais, diversidade agrícola e cumprir uma função ecológica. Até o momento, 59 sistemas de 22 países do mundo foram contemplados.

Apanhadores de flores sempre-vivas recebem certificado da FAO (foto: Márcia Campanaro)

 

Processo de reconhecimento do sistema agrícola tradicional dos apanhadores de sempre-vivas

O processo para o reconhecimento do sistema agrícola tradicional dos apanhadores de sempre-vivas teve início em 2016, quando o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) pré-selecionaram cinco locais no Brasil, entre eles a região da Serra do Espinhaço, para pleitear o selo. Em 2017, foi realizada uma ação junto aos apanhadores de flores sempre-vivas e à Comissão em Defesa dos Direitos das Comunidades Extrativistas da Serra do Espinhaço de Minas Gerais (Codecex), que levantaram como comunidades rurais aptas ao pleito, as das cidades de Buenópolis, Diamantina e Presidente Kubitscheck.

Para se candidatar, segundo informações da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater), o sistema agrícola deveria ser único e atender a determinadas características como, por exemplo, possuir uma paisagem diferenciada, rica biodiversidade, segurança alimentar, modelos de gestão diferenciados com sistemas de conhecimento local e tradicional, tecnologias de produção engenhosas, identidade cultural e valores socioculturais utilizados para sua manutenção.

A fim de auxiliar na candidatura, pesquisadores de cinco universidades públicas brasileiras, entre elas a UFVJM, foram os responsáveis pela produção do dossiê técnico-científico que conta a história do sistema agrícola tradicional dos apanhadores de sempre-vivas. São eles: professores Claudenir Fávero, do Núcleo de Agroecologia e Campesinato (NAC) e Maria Neudes Sousa de Oliveira, do Núcleo de Estudo em Ecofisiologia Vegetal (NESFV) da UFVJM; professor Aderval Costa Filho, do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (GESTA) da UFMG; professores Gustavo Soldati e Reinaldo Duque, do Laboratório de Etnoecologia e Agroecologia (LEA) da UFJF; e pesquisadora Fernanda Testa Monteiro, do Laboratório de Geografia Agrária (LGA) da USP.

O documento foi encaminhado à FAO pelo Ministério das Relações Exteriores, em novembro do ano passado, juntamente com o plano de conservação dinâmica elaborado pela Codecex em parceria com o governo de Minas Gerais, prefeituras e outros parceiros.

D.Jovita, apanhadora da Mata dos Crioulos, recebe certificado pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina (foto: Márcia Campanaro)

 

Um pouco mais sobre o sistema agrícola tradicional dos apanhadores de sempre-vivas

Localizado em áreas montanhosas, o mosaico único de paisagens e ecossistemas do Espinhaço, onde a sempre-viva é endêmica e é colhida, é uma região com rica biodiversidade e desempenha um papel crucial na regulação das chuvas da região. Os agricultores locais, também conhecidos como coletores de flores sempre-vivas, desenvolveram um sistema agrícola eficaz que combina coleta de flores, jardinagem agroflorestal, pastoreio de gado e cultivo de culturas - tudo realizado em diferentes altitudes que variam de 600 a 1.300 metros.

Esse sistema complexo é baseado em uma ampla gama de conhecimentos e práticas tradicionais passados de geração em geração, ajudando as pessoas a alcançar a harmonia com o meio ambiente e, ao mesmo tempo, garantir sua segurança alimentar e de subsistência.

Os apanhadores aprenderam a lidar com a paisagem e com todas as adversidades encontradas ao longo dos séculos. No topo da serra, eles soltam o gado em uma parte do ano, coletam e fazem o manejo das flores sempre-vivas. Nas partes mais baixas, realizam o plantio das roças de toco e fazem uso de sementes crioulas, cultivadas ao longo de gerações. O conhecimento é secular e, por meio dele, o homem vem realizando intervenções sustentáveis em regiões pouco atrativas devido às características do solo e relevo.

Movendo-se pelas montanhas e seguindo as práticas tradicionais de coleta de flores e criação de gado, as pessoas enriquecem os campos nativos com uma variedade de espécies de culturas, permitindo que os ecossistemas e paisagens se regenerem e se diversifiquem a partir dos ciclos naturais de cada espécie.

O resultado é um sistema agrícola com uma paisagem notável que tem resistido às mudanças climáticas e sociais, e refletido em importante material genético para o futuro da humanidade.

Última actualización el Viernes 13 de Marzo de 2020 08:50